quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Frases de Facebook (1)

Uma das atividades mais populares no Facebook é o compartilhamento de uma imagem sob uma frase e o nome de um autor. E os três elementos às vezes até têm relação entre si, quem diria. Jocosidade à parte, um dos campeões em menções é nosso caro Freud, então pensei em oferecer meus dois centavos na contribuição para a nitidez e densidade da sabedoria (ou não) que anda sendo disseminada, de forma algo caótica, por esta tendência, pescando e contextualizando algumas das frases que me forem familiares. Vamos lá.

A frase:



Fonte, contexto:

Desconheço. Nas Obras Completas edição standard não há registro da frase. A não ser que seja uma versão desta aqui:


Aí sim, soa familiar...

"Internet: a fonte mais exata e precisa de conhecimento" -- Sigmund Freud

A frase é de Sobre o narcisismo: uma introdução, de 1914. Diz o seguinte:

Um egoísmo forte constitui uma proteção contra o adoecer, mas, num último recurso, devemos começar a amar a fim de não adoecermos, e estamos destinados a cair doentes se, em conseqüência da frustração, formos incapazes de amar (Freud, 1914, ed. eletrônica).

Uma tradução que prefiro substitui "frustração" por "impedimentos", no sentido de bloqueios. O termo original alemão é Versagung.

O mistério que Freud está investigando neste trecho é o porquê da necessidade que temos de investir libido em algo, ao invés de represá-la, acumulá-la no Eu (ego). Como já opinei, Sobre o narcisismo é um texto instigante na exata medida em que inverte o senso comum - verdadeiro hábito freudiano, aliás -, e esboça tomar o narcisismo e o egoísmo como regras, e não exceções.

O "egoísmo forte" protege contra a doença por ser próprio de nossos esforços de autoconservação, de autopreservação. É responsável, por exemplo, por nosso recolhimento indiferente ao mundo exterior quando estamos sendo atormentados por uma dor orgânica - favorece, pois, o repouso necessário à recuperação -, e também, aliás, pela própria capacidade de dormirmos (e de sonharmos). 

No entanto, o represamento excessivo é fonte de "desprazer", "tensão" e excitações "dolorosas" com as quais tentamos lidar investindo a libido em objetos. Na melhor das hipóteses, objetos reais, e não irreais; externos, e não internos; suficientemente alteritários, e pouco revestidos, por projeção, com nosso narcisismo: ou seja, amando. Não é assim tão fácil...

Pra ter em mente:

  • A cura pelo amor pode ter efeitos colaterais. Em especial quando se configura como apaixonamento, entendido como um investimento carregado de narcisismo e baseado na idealização - amar o que falta a si próprio para se tornar perfeito -, a cura pelo amor - que Freud contrapõe e diferencia, por sinal, da cura analítica - traz consigo "todos os perigos de uma dependência opressiva".
  • Quem não agride também adoece. Nem tudo na vida é libido, reconheceu Freud em 1920, ao desenvolver o conceito de pulsão de morte (em Além do princípio de prazer). Mesmo que talvez não se possa falar em represamento quando se trata de pulsão de morte (o vienense, afinal, resistiu a batizar a energia da pulsionalidade destrutiva, possivelmente por não ter se convencido de sua positividade), não há dúvida de que a incapacidade de defleti-la para fora, para o mundo, causa também uma série de manifestações sintomáticas: a impotência e o masoquismo moral, por exemplo.

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