quarta-feira, 14 de março de 2012

Freud e a "perversão": os Três ensaios (4)


Estamos de volta, e com novo visual, cortesia da talentosa Nicole Soares. Obrigado, Nicole!

Falávamos da "democratização" freudiana dos mecanismos que subjazem às práticas sexuais mais caricatas. Pois bem, ela comparece de forma particularmente nítida à seção seguinte dos Três ensaios, intitulada “fixações de alvos sexuais provisórios” (Freud, 1996 [1905], p. 147), onde Freud se debruça sobre a escopofilia, o exibicionismo, o sadismo e o masoquismo. 

Dos dois primeiros extrai considerações sobre os fundamentos do senso estético: “parece-me indubitável que o conceito do “belo” enraíza-se na excitação sexual” (Ibid., p. 148, nota 2). O interesse pela arte surge, pois, graças a um... desvio, que Freud começa a chamar ‘sublimação’ (Ibid., p. 148). Por sua vez, no sadismo e no masoquismo, que freqüentemente coexistem no mesmo indivíduo, Freud vai identificar “o contraste entre atividade e passividade (...) [que] pertence às características universais da vida sexual” (Ibid., p. 150), e que “pode reivindicar uma elevada significação teórica” (Ibid., p. 151) por apontar para o fenômeno universal da ambivalência (Ibid., p. 151,  nota 4), o caráter simultaneamente amoroso e hostil do investimento que dedicamos a todo e qualquer objeto. A respeito do conflito entre supervalorização e asco, Freud acrescenta ao lado deste último a vergonha, como “força que se opõe ao prazer de ver” (Ibid., p. 149), e a dor, como resistência ao “exagero e fixação da atitude sexual passiva” (Ibid., p. 150). 

Suas “considerações gerais sobre as perversões” (Ibid., p. 152) marcam um distanciamento teórico em relação àqueles que se inclinaram a “adjudicar-lhes o caráter de um sinal de degeneração ou doença” (Ibid., p. 152).  

Em nenhuma pessoa sadia falta algum acréscimo ao alvo sexual normal que se possa chamar de perverso, e essa universalidade basta, por si só, para mostrar quão imprópria é a utilização reprobatória da palavra perversão (Ibid., p. 152).  

O critério possível para demarcar o que há de patológico em determinada configuração da sexualidade é, então, seu grau de rigidez.  

Na maioria dos casos podemos encontrar o caráter patológico da perversão, não no conteúdo do novo alvo sexual, mas em sua relação com a normalidade. Quando a perversão não se apresenta ao lado do alvo e do objeto sexuais normais (...) mas antes suplanta e substitui o normal em todas as circunstâncias, ou seja, quando há nela as características de exclusividade e fixação, então nos vemos autorizados, na maioria das vezes, a julgá-la como um sintoma patológico (Ibid., p. 152-153). 
Em seguida terminaremos nossa leitura inicial do primeiro dos três ensaios abordando a célebre fórmula que o fecha, segundo a qual a neurose é o negativo da perversão.

Referências:
FREUD, S. (1905) Três ensaios sobre a Teoria da Sexualidade. Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, vol. VII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. Disponível como ebook em inglês (Three Contributions to the Theory of Sex) no site da Kobo:Kobo has over 2 million ebooks to choose from!

Nenhum comentário:

Postar um comentário